Mal havia terminado o diálogo com um ser que estava incorporado numa das médiuns e outra já incorporou um outro ser que me perguntou muito admirado:
- Como é que tu consegue falar com os mortos? Cara, isso é muito legal! Será que vou conseguir fazer isso um dia?
- Claro, tu tbm tá morto, disse eu.
- Pera aí, eu tô vivo! Tu não entendeu, to falando dos mortos, como é que pode falar com eles?
- Onde é que tu estava antes de vir aqui?
- Eu tava em casa.
- Onde tu morava?
- Morava não! Eu moro aqui perto. E sempre vejo um monte de gente vindo pra cá e hoje resolvi ver o que era.
- Certo, e o que tu fazia quando era vivo?
- Que quando era vivo? Eu sou vivo. Eu era pintor.
- Que legal. Tinhas uns pintores trabalhando aqui há pouco tempo.
- Eu vi. O rapaz era trabalhador, mas de vez em quando dava umas escorregadas e tu tinha que chamar a atenção.
- Bom, quantos anos tu tinha?
- Que 'tinha', eu tenho 47 anos.
- Não tinha mulher, filhos?
- Eu 'sou' solteiro', moro só com a minha mãe.
- Pois é. Mas tu morreu de que?
- Bah, mas será que tu não entendeu mesmo? Eu tô vivo!
- Certo. vou colocar um espelho na tua frente pra ti ver que ta falando pelo corpo de uma outra pessoa. E então? Tá vendo?
- Isso é bruxaria, bem que me disseram que esse negócio de espiritismo era coisa do diabo!
- Nâo, tu tá vendo é o corpo da médium pela qual ta falando comigo.
- Não acredito!
- Ok. É o seguinte: vou te fazer lembrar do momento da tua morte.
- Mas que morte??? Não tá vendo que eu to vivo e conversando contigo aqui?
- Lembra! Como foi que tu morreu. O que aconteceu?
- Eu tava lendo o jornal na mesa e desmaiei , só isso.
- E quem foi que te encontrou?
- Minha mãe.
- E como ela reagiu?
- Começou a gritar e chorar.
- E depois?
- Depois umas pessoas lavaram meu corpo, botaram uma roupa e...
- E o que?
- Me botaram num caixão...
- E depois? Vamos acompanhar o corpo.
- Me levaram pro cemitério e ficou tudo escuro. Depois tava lá em casa de novo.
- Que ano era quando tu morreu?
- Eu não morri!!!
- Tá certo. Lembra uma data aí. Quando tava lendo o jornal, que ano era?
- 1960.
- Então, eu nasci em 1967, tu já tava morto há tempos quando eu nasci. E estamos em 2010. Já faz 50 anos que tu morreu.
- Agora eu to confuso, tu disse que estamos em 2010, então quer dizer que eu tenho mais de noventa anos?
- Se tivesse vivo teria.
- Mas eu não morri!
- Teu espírito não mas o teu corpo sim. Tu não tinha nenhuma religião?
- Eu era católico.
- Olha só. Tua mãe já deve ter morrido tbm. Vamos localizar a velha (disse a uma outra médium).
- Velha. Olha como ele fala da minha mãe...
- Queria que eu chamasse como? De garotinha? Ela já era velha quando tu morreu. Olha ai do teu lado, a médium disse que ela já chegou e vai te levar com ela.
- Não!!
- Pq?
- Ela é um espirito. Veio flutuando!!!
- Mas é tua mãe cara! Qual o problema?
- Ela é um espirito, espírito é fantasma!! Tô com medo!
- Medo de que? Tu tbm é fantasma criatura. Faz o seguinte, enfia a mão no braço do sofá pra ver como tu tbm é fantasma.
- Eu não! Enfia tu a tua mão.
- Vou te fazer atravessar a parede atras de ti e voltar. Ta vendo, tu tbm é um espirito.
- Eu não quero mais ficar aqui!
- Tá bom. Vai com a tua mãe então.
- Não!!! Ela é um fantasma. Manda ela ir na frente então.
- Ta certo.
- Eu vou com aquela senhora ali que ta me chamando.
- Ótimo. Mas vou te dizer uma coisa... ela tbm é um 'espírito'.
- Mas pelo menos tá com os dois pés no chão...
E assim foi o diálogo com nosso amigo que, assim como a grande maioria da humanidade não percebe que morreu. Podemos considerar esse ser como sendo meio 'neutro', nem bom nem mau. Se fosse uma pessoa má quando vivo acabaria indo parar no umbral ou coisa pior, se fosse uma pessoa 'boa' teria algum mérito para ser resgatado. Acabou ficando por aqui, estacionado no tempo, por 50 anos.
Gelson Celistre